sábado, 30 de março de 2013

A Medicina Manchada de Sangue


A Medicina Manchada de Sangue 


Jorge Cecílio Daher Jr 
médico 


Em 21 de março o Portal Médico, site do Conselho Federal de Medicina (CFM), publicou deliberação em que os Conselhos de Medicina apóiam a aprovação da lei que regulamenta o aborto no Brasil além dos casos já permitidos, gestação conseqüente a estupro e gestação de feto anencéfalo, permitindo abortamento por qualquer motivo para gestação de até 12 semanas. 

Em nota um tanto confusa, o presidente do CFM, Roberto D’Ávila, afirma que a deliberação não é favorável ao aborto e sim um posicionamento favorável à autonomia da mulher. Confusa e paradoxal a informação do CFM assim se expressa: “Por maioria, os Conselhos de Medicina concordaram que a Reforma do Código Penal, que ainda aguarda votação, deve afastar a ilicitude da interrupção da gestação em uma das seguintes situações: a) quando “houver risco à vida ou à saúde da gestante”; b) se “a gravidez resultar de violação da dignidade sexual, ou do emprego não consentido de técnica de reprodução assistida”; c) se for “comprovada a anencefalia ou quando o feto padecer de graves e incuráveis anomalias que inviabilizem a vida independente, em ambos os casos atestado por dois médicos”; e d) se “por vontade da gestante até a 12ª semana da gestação”. 

Eis que a autonomia da mulher, segundo o CFM, permite a escolha pela interrupção da gestação mas esse ato não significa descriminalizar o aborto. O presidente de um conselho federal que diz representar 400 mil médicos criou uma forma excludente de aborto, pois interromper a gestação em uma das quatro opções acima descritas não mais será considerado aborto, nas palavras do presidente D’Ávila. 

Como justificativa, as causas sanitárias, que por alegação afirmam que abortos clandestinos são responsáveis por agravo à saúde da mulher, e hoje são estimados em 243 mil abortamentos ao ano em nosso país. A experiência mundial não coaduna com a proposta de regulamentação do aborto por demonstrar que nos países em que o aborto foi regulamentado, a incidência de abortamentos cresceu em até 100 vezes, segundo dados da Espanha. Em um país onde o pré-natal é inacessível a boa parte da população, onde o atendimento na rede pública é sobrecarregado por falta de estrutura física e financeira, cabe perguntar se há preocupação com a autonomia da mulher ou se existem outros interesses, até então ocultos? 

É por demais coincidência, para não ser um plano orquestrado. A América Latina em bloco, desde 1969 é signatária de um tratado internacional que reconhece que em todos os países do bloco aceitam que a vida se inicia na concepção, o que levou o ministro Ayres Brito afirmar: “A Constituição brasileira, incorporando o Tratado Interamericano de Direitos Humanos através de seu artigo 5 parágrafo 2, estabelece claramente, assim como todos as constituições dos demais países da América Latina, QUE A PERSONALIDADE HUMANA SE INICIA NO MOMENTO DA CONCEPÇÃO, QUE O DIREITO À VIDA TAMBÉM SE INICIA NO MOMENTO DA CONCEPÇÃO, e que o aborto somente poderá ser admitido em casos raros e excepcionais, nunca como a regra geral. O DIREITO À VIDA É CONSTITUCIONALMENTE PROTEGIDO, EM GERAL, DESDE O MOMENTO DA CONCEPÇÃO. Se o Brasil, ou qualquer outro país da América Latina, quiser legalizar o aborto de modo amplo, ele deverá primeiro revogar sua ratificação ao Tratado Interamericano de Direitos Humanos.” Não apenas no Brasil a pressão pela legalização do aborto é imposta contra os interesses da população, que repudia o aborto. As Suprema Cortes do Urugai, México e Argentina. 

Se o ordenamento jurídico estabelece que a vida se inicia na concepção, as evidências científicas demonstram que o embrião é autônomo desde a concepção, sua autonomia se expressa na estupenda independência do embrião de formar-se a si mesmo, dependendo da mãe apenas no fornecimento de oxigênio e na ausência de doenças infecciosas. 

A posição do CFM favorável ao abortamento até 12 semanas, que na opinião do presidente Roberto D’Ávila não é aborto, mas autonomia da mulher, baseia-se em uma ignorância científica, divulgada como credo abortista em meios pseudo-científicos, que considera que o embrião se torna ser humano quando ele adquire a forma humana. 

A tradição médica brasileira sempre se pautou pela defesa da vida. Baseado no humanismo da Medicina brasileira, o próprio CFM convocou para o próximo mês uma marcha em defesa do SUS, reivindicando dignidade às vidas dos brasileiros que dependem do Sistema Único de Saúde; paradoxalmente, mancha de sangue a Medicina brasileira ao defender o aborto e desconsidera a capacidade pensante dos médicos brasileiros ao chamar aborto de autonomia da mulher. 

Existe uma esperança, a mobilização social, a começar dos médicos, e já adianto que fiz a minha parte ao enviar email ao CFM com meu protesto, mas passando pela sociedade, que deve gritar alto contra o atentado à vida que está sendo endossado pelo CFM. 

Coincidentemente, uma semana após o conclave que deu à cristandade um papa que prima sua vida pela firmeza de opinião em defesa do ser humano desde a concepção, os que se dizem representantes dos médicos brasileiros (e já digo que nenhum médico foi consultado sobre a decisão), elegem o sangue de inocentes como bandeira de uma modernidade distante, que interessa ao governo federal, que nunca escondeu sua defesa do aborto como direito da mulher e que macula uma Medicina digna, pautada no direito incondicional à vida.

Moção de Repúdio à Posição do Conselho Federal de Medicina




Em nome da Associação Médico-Espírita do Brasil (AME-Brasil) expresso a minha indignação e a dos médicos que represento diante do posicionamento do Conselho Federal de Medicina (CFM) que se manifestou favoravelmente ao aborto até as 12 semanas de gestação, caso a mãe assim o deseje. 

Ao contrário do que foi anunciado, o tema não foi amplamente debatido entre os médicos. Em nenhum momento fomos notificados de que o CFM pretendia apresentar tal posicionamento. É de se ressaltar que no “I Encontro Nacional dos Conselhos de Medicina”, onde foi feita a votação, e mesmo no site da Instituição, não houve anúncio de nenhuma notícia sobre o assunto, apenas foi passada a informação de que haveria uma mesa redonda “Aborto e Desigualdade Social”. Nada mais. 


Conclui-se que não houve transparência do CFM nessa tomada de posição de magna importância para os destinos da nação brasileira, nem tampouco no anúncio da votação e no modo como foi feita. Não se respeitou a tradição médica do nosso país que sempre lutou em defesa da vida. Tudo leva a crer que foi manobra política de uma minoria que não tem representatividade para falar em nome de 400 mil médicos. 

A nosso ver, as consciências humanas têm um compromisso fundamental com a verdade, por isso devem mergulhar fundo no estudo do extraordinário fenômeno da vida, em busca do seu real significado, sem aceitar o raciocínio dogmático reducionista, que tenta encarcerá-lo num mero jogo de palavras, ao invés de discutir as inúmeras incógnitas para as quais a ciência materialista não tem respostas. 

Aos menos avisados que, preconceituosamente, procuram desqualificar os nossos argumentos contra o aborto como sendo de mentalidades religiosas, temos a dizer que, embora os consideremos legítimos, podemos até mesmo abdicar deles para demonstrar através de pesquisas científicas, e não de suposições, que a vida não só é um bem indisponível, mas que há vida indisponível no embrião e no feto. 

O pluralismo democrático diz respeito à convivência de opiniões, comportamentos e posições ideológicas distintas no seio de uma comunidade, porém não à prática de delitos em seu nome. Esta é nossa resposta aos que nos dizem que o aborto é um direito da mulher. Não existe engano maior. Tirar a vida de alguém é crime. A mulher, tanto quanto a equipe médica, o Estado, ou o companheiro, não tem esse direito. E o Ordenamento Jurídico Brasileiro reconhece a nossa posição. 

O artigo 5º da Constituição Brasileira garante a inviolabilidade do direito à vida, defendendo-o como bem fundamental do ser humano. É certo que o artigo 4º afirma que a personalidade civil do homem começa no nascimento com vida, mas a lei põe a salvo que ela deve ser defendida desde a concepção. (Código Civil, lei federal 3071). E mais, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, celebrada na Costa Rica, em 22 de novembro de 1969, deixou claro, no chamado Pacto de São José da Costa Rica, assinado por inúmeros países, entre os quais o Brasil, que esse direito deve ser protegido, desde o momento da concepção. A Lei Maior de nosso país espelha, portanto, a vocação pacífica do nosso povo, uma vez que este, em sua imensa maioria, já se manifestou contrariamente ao aborto, que é uma das maiores violências que se pode cometer contra o ser humano. 

Insistimos que é preciso buscar na Ciência as respostas à pergunta essencial: “Onde começa a vida?”. Embora a ciência não explique como uma célula unidimensional (zigoto) produz um bebê tridimensional, não saiba, portanto, quais os processos que regulam os embriões, ela já nos oferece inúmeros argumentos para sermos contra o aborto. É o que faremos a seguir, daremos em rápidas pinceladas alguns desses argumentos. 

Aprendemos nos melhores tratados de embriologia que a vida é um continuum que vai do zigoto (célula-ovo) ao velho, sem solução de continuidade. Ainda que existam vozes discordantes, este é um forte argumento científico em favor do respeito à vida desde a concepção. Sendo a vida um bem indisponível, atentar-se contra ela, seja em que fase for, é crime. Além disso, sendo possível demonstrar que o embrião tem vida, não haveria heresia maior do que se considerar o aborto um direito da mulher. Cairia, automaticamente, por terra, sua propalada autonomia para decidir quanto à interrupção da gravidez. Nem a gestante e nem ninguém pode decidir quem vive e quem morre. Mas esse não é o único argumento da Ciência em defesa da vida. Há muitos mais. 

Embora concordemos com alguns fundamentos da Teoria neodarwinista da evolução das espécies e os adotemos, constatamos que ela tem muitas falhas. A principal delas é ancorar no acaso as explicações da evolução das espécies. O acaso não explica a vida. Dois físicos conceituados, Igor e Grichka Bogdanov, juntamente com matemáticos do CERN, o mais importante Centro de Pesquisas da Europa em Física das Altas energias, demonstraram que é impossível juntar em uma célula, por acaso, as duas mil enzimas de que ela tem necessidade para funcionar. Embora sejam verdadeiras e de fato tenham ocorrido, as mutações e a seleção natural são insuficientes para explicar a evolução das espécies. O acaso, por si só, não tem o poder de organizar e conduzir. A evolução das espécies deu-se de forma ordenada, obedecendo a um projeto altamente inteligente, desde os cristais, as bactérias e amebas até o ser humano. O ser vivo é uma ilha de organização em meio ao caos. Uma célula tem arranjo inteligente das partes. Ela foi planejada. Recentemente, estudos bioquímicos da célula revelaram que há, nela, um arranjo intencional das partes, com indícios claros de que foi planejada. Essas e outras pesquisas científicas tem apontado para a existência de um Planejador Inteligente, o Grande Doador a quem chamamos Deus. 

A ciência diz que a célula-ovo não é um amontoado de células descartáveis. A vida de um novo ser tem início nela e prossegue, sem parar, em um movimento continuo do embrião ao velho, sendo que todo o padrão tetradimensional do novo ser está contido no zigoto. A célula-ovo tem DNA próprio, fruto da união do gameta masculino com o feminino. Recebe, é obvio, os genes da mãe, mas seu genoma é bem diferente. A mãe hospeda o novo ser, mas o feto não faz parte intrínseca do seu corpo. Para não ser expulso como corpo estranho pelo sistema de defesa do organismo materno o feto produz substâncias que o mantém vivo, durante a gestação, estabelecendo-se um acordo tácito entre hóspede e hospedeira. Prova cabal de que são dois seres distintos. 

Estudos realizados desde a década 1970 sobre psiquismo fetal demonstram que a memória está presente, antes da formação do cérebro, desde o início da gestação, e que o embrião é capaz de comandar sua própria mente, adaptar-se e adequar-se a situações novas. 

O embrião tem, portanto, vida própria, independente da mãe. De forma alguma, o aborto pode ser considerado um direito da mulher. 

O aborto é uma das formas mais sangrentas de violência, porque o ser em formação não tem como se defender. E a mulher que recebeu do Ser Supremo a missão transcendente de gerar vidas, comumente, não se deixa aprisionar pela visão hedonista que impera no mundo. Sobretudo, quando ela vê as imagens do feto em gestação, quando acompanha os batimentos do coraçãozinho de seu filho a partir das três primeiras semanas. Não, ela não pensa em aborto. O que a gestante precisa é de amparo à maternidade, de esclarecimentos quanto ao uso de métodos anticoncepcionais confiáveis e de vias fáceis de acesso a eles, para que possa planejar sua família. Uma sociedade organizada, segundo as leis fundamentais da vida obrigatoriamente deve ter o amor na sua base de sustentação. Entre outras ações, tem o dever de cuidar da educação de crianças e jovens, dar todo o apoio à maternidade e à paternidade responsáveis, além de cuidar dos que trabalharam uma vida toda e tem de ser amparados na velhice. 

A sociedade que apela para o aborto declara-se falida em suas bases educacionais, porque dá guarida à violência no que ela tem de pior, que é a pena de morte para inocentes. Compromete, portanto, o seu projeto mais sagrado que é o da construção da paz. 

Espero, caros colegas, que nos unamos para que a nossa nação não tenham falidas as suas bases educacionais. Espero vê-los todos lutando em defesa da vida e da paz. 



Marlene Nobre 

Presidente da Associação Médico-Espírita do Brasil 


A Natureza em Números