Uma pesquisa desenvolvida por dois
médicos no Hospital São Francisco, do Complexo da Santa Casa de Porto Alegre,
mostra a relação entre a medicina e a espiritualidade. No levantamento feito
com 260 pacientes desde maio deste ano, a conclusão foi que a fé tem influência
no tratamento de doenças. Os números da primeira fase do estudo serão
apresentados no 67º Congresso Brasileiro de Cardiologia, que será realizado de
14 a 17 de setembro em Recife (PE).
“Nós
temos a presença de Deus no nosso dia a dia. Eu tenho inúmeras histórias na
minha vida de cirurgião cardíaco em que a gente sente a presença de Deus”, diz
o cirurgião cardiovascular Fernando Lucchese, que é católico. Ele e o
cardiologista Mauro Pontes, seu parceiro na pesquisa e espírita, fazem parte de
uma parcela de pesquisadores que crê em Deus. “Milagre para nós é quase que um
fato diário”, diz Pontes.
Na
primeira etapa, o estudo conduzido pelos dois médicos procurou saber o que os
doentes e médicos pensam sobre a espiritualidade e perceber como a religião
ajuda a superar as doenças. Entre os 260 pacientes ouvidos, todos disseram que
acreditam em Deus. Quando questionados sobre a crença na vida depois da morte,
71,1% dos participantes da pesquisa disseram acreditar. Quando se cruzam as
perguntas sobre religião e saúde, fica evidente a importância da
espiritualidade: mais de 84% acredita que ter fé faz bem à saúde e 88,2% usa a
fé como conforto na doença.
“Eu
sempre tive fé, desde o ambiente familiar me criei com fé. Respeito Deus, gosto
de Deus, acredito em Deus, tenho fé em Deus”, diz Antônio Gilberto Lehnen, que
passou por um transplante de coração há 10 anos. “Eu devo a minha saúde a duas
situações. Uma é a competência médica, a ciência. De outro lado está a oração,
muita oração”, conta ele, que é um dos pacientes de Lucchese.
Para surpresa dos
pesquisadores, mais da metade dos pacientes gostaria que o médico falasse sobre
espiritualidade. Mais de 70%, no entanto, diz que o médico nunca falou sobre o
assunto. Outro dado chamou a atenção dos médicos: 16% dos pacientes acham que a
doença é um castigo de Deus.
“Eles
têm a crença de que o comportamento deles foi inadequado. Acham que tiveram
culpa pelo desenvolvimento da doença e acham que Deus está punindo eles por
causa desse comportamento”, explica Pontes. Esses pacientes, diz o
cardiologista, têm um índice de mortalidade 50% maior, mas o motivo ainda não
foi descoberto. “O mecanismo que associa essa crença com o aumento da
mortalidade ainda está sendo esclarecido”, conclui.
Outro
aspecto que está sendo estudado é a influência do comportamento e do estado de
espírito dos pacientes na cura. “Estamos chegando progressivamente à bioquímica
das doenças da alma. Por exemplo, um sujeito que é raivoso, explosivo, a gente
não pode dizer que seja doente mental, ele tem uma doença da alma, a raiva”,
diz Lucchese.
Por
meio de exames de sangue, foi verificado que as pessoas raivosas têm maior
nível de interleucina 6 no sangue. “Nós somos corpo, mente e espírito. Nestes
indivíduos se detectou que no sangue eles há um produto em nível mais alto, que
é chamado marcador de inflamação. É a interleucina 6, proteína C reativa
ultrassensível, são marcadores que indicam no organismo alguma coisa que vá nos
levar à doença”, explica o médico.
Por
outro lado, há estudos demonstrando que em comunidades religiosas os
integrantes têm índices mais baixos de interleucina 6 no sangue. “Nossa próxima
fase na pesquisa será exatamente isso. Estudar a bioquímica nos procedimentos
cardiovasculares”, conclui.
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